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Segurança psicológica: 3 experimentos para repensar as relações no trabalho

Atualizado: 16 de dez. de 2024

A segurança psicológica se tornou um daqueles termos que todo mundo fala, mas que, na prática, pode parecer um pouco intangível. O conceito, que vem ganhando mais espaço nas discussões sobre trabalho e cultura organizacional, abrange a criação de um ambiente onde as pessoas se sentem seguras para compartilhar ideias, levantar preocupações e aprender com os erros. Mas como trazer isso para o dia a dia de maneira estrutural, para além da mudança de "mindset" (modelo mental) das pessoas?

No último artigo no blog do CHAMA Coletivo “Criando uma Estrutura Psicologicamente Segura”, abordamos mais sobre a popularização e esvaziamento do conceito e também mencionamos algumas mudanças estruturais a nível organizacional para começar a criar um ambiente com maior segurança psicológica.

Mas quantas vezes você já se sentiu impotente diante dessas mudanças organizacionais? Por mais que a gente saiba o quanto elas são necessárias, muitas vezes não estão ao nosso alcance imediato. Eu pelo menos tenho momentos frequentes de dialogar com esse sentimento.

Motivada pela minha revolta com a sensação de impotência, a minha intenção com esse artigo é compartilhar possibilidades de experimentos que você pode testar para influenciar, de maneira estrutural, as interações no ambiente em que você está - independente de ter ou não um cargo formal de liderança.

Lembrando que esses pequenos experimentos que proponho aqui não são uma solução mágica que funcionam em todos os contextos e também não vão, por si só, garantir que todas as pessoas se sintam seguras e ouvidas. A segurança psicológica não é um ponto final, mas um processo contínuo de ajuste e construção de confiança e conexão nas relações.

1) Check in e Check Out: Abrindo espaço para as emoções

Vamos começar com algo que parece simples, mas que depois que comecei a praticar se tornou algo que não abro mão: check in e check out nas reuniões.

Quantas reuniões você já entrou sem nem respirar direito, emendando uma reunião atrás da outra, já na correria do trabalho?

Em vez de começar a reunião direto na pauta, que tal tirar 10 minutos para perguntar ao grupo: "Como você está chegando hoje?" Essa pequena pausa para ouvir cada pessoa abre espaço para que ela saia de um estado mental acelerado e possa trazer seu estado emocional, algo que, em muitos ambientes, passa batido.

Ao final da reunião, a ideia é fazer um check out: "Como você está saindo?" ou "O que ficou para você da reunião de hoje?". Isso é uma forma de fechar a reunião de maneira intencional, permitindo que as pessoas reflitam sobre o que levaram da conversa e não saiam desesperadas porque acabou o tempo e precisam entrar correndo na próxima.

Roda das emoções, uma das ferramentas que pode complementar esse experimento, ampliando o repertório emocional ao responder o check in ou check out.
Roda das emoções, uma das ferramentas que pode complementar esse experimento, ampliando o repertório emocional ao responder o check in ou check out.

Por que isso faz diferença?

Ainda vivemos num mundo de trabalho onde ser vulnerável é visto como fraqueza. Com o check in e check out, estamos mexendo diretamente nesse ponto. É sobre criar uma estrutura onde todo mundo se sente convidado a compartilhar como está — de verdade. Isso desafia a cultura de que o trabalho é um lugar onde emoções devem ser ignoradas.

A segurança psicológica não surge do nada, ela é construída. E uma das maneiras de começar essa construção é oferecendo espaços estruturados para que as pessoas possam ser verdadeiras. Quando cada um tem a chance de dizer como está se sentindo, cria-se um espaço de cuidado mútuo, onde as pessoas percebem que não precisam estar "no piloto automático" o tempo todo. Quando você coloca isso em prática, começa a ver que as pessoas relaxam, se conectam e, adivinhe só, produzem com mais qualidade e presença.



2) Os Seis Chapéus do Pensamento: Convidando Diferentes Perspectivas

Os Seis Chapéus do Pensamento é uma ferramenta criada por Edward de Bono que nos ajuda a olhar para uma situação de forma mais intencional e organizada. A ideia é que cada chapéu representa um tipo de pensamento (fatos, emoções, criatividade, cuidados, benefícios e organização) que a equipe consegue utilizar para explorar diferentes perspectivas de forma estruturada e sem julgamentos.



A perspectiva convidada por cada chapéu, de forma resumida.
A perspectiva convidada por cada chapéu, de forma resumida.

Os Seis Chapéus podem ser aplicados em diversos contextos, como resolução de problemas complexos, tomadas de decisão em grupo, sessões de "brainstorming"  (toró de ideias), ou até para avaliar a viabilidade de um novo projeto ou produto.

Há diferentes formas de organizar e facilitar o uso da ferramenta, podendo ser adaptada a diferentes necessidades. É recomendado que o processo inicie e termine com o chapéu azul, apresentando o cenário em questão e finalizando com os encaminhamentos e próximos passos. As demais perspectivas podem ser convidadas na ordem que fizer sentido para o assunto e grupo em questão. Por exemplo, pode-se usar o Chapéu Preto (cuidados) logo após o Chapéu Amarelo (benefícios) para avaliar os pontos positivos antes de identificar os riscos. Ou, em algumas situações, pode ser útil usar o Chapéu Verde (criatividade) logo após o Chapéu Branco (fatos) para gerar ideias com base em dados. O importante é que todas as perspectivas tenham um tempo e espaço para serem expressadas.

Por que isso faz diferença? Muitas equipes caem na armadilha da "harmonia artificial" — sabe quando todo mundo concorda na reunião, mas depois sai murmurando opiniões verdadeiras só com quem tem mais afinidade? Ou então quando o viés de autoridade prevalece e ninguém ousa discordar do chefe? É aqui que essa ferramenta entra como uma estrutura para quebrar essa dinâmica. Ela convida para a mesa as divergências que, muitas vezes, ficam escondidas e faz isso de forma estruturada, sem que ninguém saia como o "chato" da sala.

Ou seja, em vez de depender da boa vontade ou “coragem” das pessoas para "falar abertamente", você cria um espaço onde cada tipo de pensamento (positivo, crítico, criativo, emocional, factual) tem um momento para ser expressado. Isso ajuda a tirar o peso da individualidade e coloca as diferenças de opinião na estrutura da conversa. Quando questionar decisões, apontar riscos e sugerir novas ideias é parte do processo, e não uma ação isolada de alguém, fica muito mais fácil trazer a verdadeira diversidade de pensamentos e começar a construir um espaço de segurança psicológica.

3) Celebration Grid:  Celebrando os aprendizados com os erros

O Celebration Grid (ou "Grade de Celebração", em tradução livre) é uma ferramenta de retrospectiva que nos convida a celebrar os aprendizados, não só com as conquistas e os resultados bem sucedidos, mas também com os experimentos que não saíram como planejado.

Essa ferramenta pode ser utilizada em momentos de retrospectiva, após o encerramento de um projeto, produto ou ciclo de trabalho. Também é útil em reuniões de equipe focadas em melhoria contínua, onde a reflexão sobre o que funcionou e o que não deu certo é fundamental. Ao final de uma fase de experimentos, essa estrutura ajuda a olhar para os fracassos e sucessos como parte do processo de evolução, contribuindo para um ambiente onde as pessoas sentem que podem se arriscar e aprender.



Verde: é a zona de celebração Vermelho: são os erros, muitas vezes não intencionais, que repetimos e precisamos falar abertamente sobre.

Cinza: são as zonas com baixo potencial de aprendizado ou que são mais raras de acontecer

Laranja: É a zona de maior aprendizado, que está no seu auge na área de experimentos, onde temos 50% de chance de falhar e 50% de chance de ter resultados bem sucedidos.

Por que isso faz diferença? Vivemos numa cultura que exalta a perfeição, seja no trabalho ou fora dele. É só dar uma olhada no feed das redes sociais para entender. A lógica é: celebre as vitórias, esconda os erros. O resultado? A gente passa a vida tentando evitar erros, ao invés de aprender com eles. E a segurança psicológica no trabalho depende exatamente do oposto: criar um ambiente onde errar não só é permitido, como também é visto como uma oportunidade de aprendizado. Com o uso de ferramentas como o Celebration Grid , ao invés de colocar a “abertura ao erro” na conta do indivíduo, isso se torna um processo estrutural e coletivo. Ao fazer isso, criamos um ambiente que incentiva as pessoas a se sentirem seguras para testar novas abordagens com menos medo do fracasso, gerando mais inovação.



Esses três artefatos — o Check In e Check Out, os Seis Chapéus do Pensamento, e o Celebration Grid — são pequenas, mas poderosas ferramentas que abrem o caminho para uma intervenção mais profunda na criação de um ambiente com maior segurança psicológica. Na minha experiência, eles funcionam porque desafiam de maneira sutil as regras estabelecidas na cultura de trabalho tradicional, enquanto criam oportunidades de conexão, colaboração e aprendizado contínuo.

Se você chegou até aqui, vou adorar saber: o que achou dessas ideias? Se você já testou esses ou outros experimentos para repensar as relações no trabalho, compartilhe com a gente nos comentários.



Artigo escrito pela Flávia Barbosa e recebeu pitacoria de Stephanie Velozo Crispino e Klyns Bagatini.


Todos um mesmo fogo, cada um a sua própria CHAMA.

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